Todo pai ou mãe comete erros. Afinal, errar faz parte da natureza humana, mesmo com as melhores intenções em mente. "Na busca por acertar, muitos pais acabam cometendo erros que, sem perceber, impactam o desenvolvimento emocional e comportamental das crianças. Pequenas atitudes no dia a dia podem gerar insegurança, baixa autoestima ou até dificuldades na construção de relacionamentos saudáveis", diz a pediatra Loretta Soares Campos, membro da Sociedade Brasileira de Pediatria e educadora parental.
A psicóloga Larissa Fonseca, membro da Sociedade Brasileira de Psicologia, reforça que os comportamentos, na maioria das vezes, não são propositais. "Podem ocorrer devido à falta de tempo ou pela experiência vivenciada na própria criação", explica. "A infância é um período crítico para o desenvolvimento das conexões neurais que formarão a base emocional e cognitiva da criança", acrescenta.
A boa notícia? Nunca é tarde para ajustar o caminho para garantir um desenvolvimento emocional e cognitivo mais saudável para as crianças. "Os pais não precisam ser perfeitos, aliás, não existe parentalidade perfeita. Mas pequenas mudanças na abordagem podem transformar a relação com os filhos e contribuir para o desenvolvimento de crianças mais seguras, emocionalmente equilibradas e felizes. Educação parental é um aprendizado contínuo – e, acima de tudo, um convite à conexão e ao respeito mútuo", destaca Loretta Campos.
Por isso, é fundamental que os pais saibam identificar comportamentos que podem prejudicar os filhos. Para ajudar, Loretta Campos, Larissa Fonseca e a pediatra Cecilia Gama Tartari, Clínica Mantelli (SP), separaram os principais erros que os pais cometem com os filhos e o que fazer no lugar para fortalecer a conexão e o desenvolvimento dos filhos. Confira!
1. Diminuir ou negligenciar os sentimentos da criança
Frases como “Não foi nada” ou “Esquece isso”, podem parecer inofensivas, mas fazem com que a criança se sinta mal por sentir um desconforto. Com o passar do tempo, se constrói a crença inadequação por estar sentindo o que sinto ou pode tornar-se até uma pessoa com dificuldade para demonstrar emoções. Isso pode ensinar a criança a reprimir emoções, dificultando o desenvolvimento da inteligência emocional. Além disso, é possível desenvolver até um aumento da ansiedade, já que o cérebro não aprende a lidar com frustrações de maneira saudável.
✔ O que fazer no lugar: em vez de desconsiderar o que ela sente, ajude-a a nomear o que está acontecendo. Pergunte para a criança o que incomodou e o que ela está sentindo. Diga, por exemplo: “Eu sei que você está triste porque perdeu seu brinquedo. Quer me contar mais sobre isso?" Pense em alternativas para evitar que aquilo aconteça novamente, de acordo com o contexto em que a situação está inserida. Dessa forma, ativam-se áreas do cérebro ligadas ao autocontrole e ensina a criança a processar os sentimentos sem os reprimir.
2. Excesso de proteção
Não é fácil ver os filhos passando por dificuldades. Muitos pais tentam poupar os filhos de qualquer decepção, resolvendo problemas por eles e impedindo que enfrentem desafios. Mas, não as vivenciar na infância, dificulta a conexões neurais essenciais para a tomada de decisão e o enfrentamento de desafios na vida adulta. Isso pode prejudicar a autonomia das crianças, torná-las dependentes, inseguras e com baixa tolerância à frustração.
✔ O que fazer no lugar: permita que seu filho vivencie desafios proporcionais à sua idade. Em vez de impedir que ele erre, ajude-o a aprender com os erros. Se ele perdeu em um jogo, por exemplo, acolha a frustração e ensine sobre resiliência: “Eu sei que você queria ganhar, mas faz parte do jogo. O que podemos aprender para melhorar da próxima vez?” Cada pequeno desafio superado fortalece a confiança e a habilidade de lidar com imprevistos.
3. Permitir o uso excessivo de telas
Usar o celular toda vez que está entediada ou frustrada afeta diretamente o desenvolvimento do córtex pré-frontal, responsável pela atenção, controle de impulsos. O excesso de dopamina liberada quando utilizamos um tablet também torna outras atividades menos interessantes.
✔ O que fazer no lugar: incentivar e promover brincadeiras que envolvam criatividade, ar livre e movimento. Jogos, livros e até pequenas tarefas do dia a dia ativam redes neurais importantes para a concentração e a paciência. É natural que a criança se sinta inquieta.
4. 'Não' que se torna 'sim'
Quando as regras mudam, principalmente em função da solicitação e insistência das crianças, demonstra que não há limites insuperáveis, ela não desenvolve tolerância à frustração e mostra que ela pode tudo.
✔ O que fazer no lugar: diga não apenas quando tiver certeza. Estabeleça regras simples e cumpra o que foi combinado de forma respeitosa. Por exemplo: “Depois do jantar, é hora de escovar os dentes e dormir. Vamos juntos?" Isso ajuda a criança a internalizar limites de forma natural, sem precisar de punições severas. Mas se ela resistir ou se negar à regra, deixe claro que esse era o combinado e que o momento deve ser aquele. O cérebro funciona bem com padrões claros e limites.
5. Comparar com outras crianças
“Por que você não é como seu irmão?” ou “Seu amigo já sabe fazer isso e você ainda não?” Comentários como estes podem minar a autoestima da criança e gerar sentimentos de inferioridade ou competição desnecessária. As crianças podem se tornar mais inseguras ou extremamente autocríticas, com dificuldades para lidar com erros.
✔ O que fazer no lugar: valorize o esforço e as conquistas individuais do seu filho, não apenas os resultados. Jamais compare e valorize o processo, não apenas o resultado. Cada criança tem seu próprio ritmo de desenvolvimento. Em vez de comparações, incentive o progresso pessoal: “Olha só como você conseguiu melhorar nisso!” ou “Você está se esforçando muito, parabéns!” Isso fortalece a autoestima e a autoconfiança, estimulando o sistema de recompensa do cérebro de forma positiva, o que, por sua vez, aumenta a motivação para aprender e crescer sem medo de errar.
6. Exigir obediência cega
Muitos pais acreditam que crianças devem obedecer sem questionar, pois “sabem o que é melhor para elas”. Esse comportamento pode levar a filhos inseguros, com dificuldade de expressar opiniões e se posicionar diante de desafios.
✔ O que fazer no lugar: encoraje a autonomia, permitindo que a criança compreenda os motivos por trás das regras. Explique suas decisões e abra espaço para diálogo. Isso não significa deixar a criança fazer tudo o que quer, mas sim ensiná-la a pensar e compreender limites de forma respeitosa.
7. Usar ameaças e punições como método disciplinar
"Se você não obedecer, vai apanhar!” ou “Se fizer isso de novo, vai ficar de castigo o dia inteiro!” são frases comuns na educação baseada no medo. No entanto, esse tipo de abordagem pode gerar ressentimento, rebeldia ou submissão excessiva, além de não ensinar a criança a fazer escolhas melhores no futuro.
✔ O que fazer no lugar: substitua punições por consequências educativas. Explique para a criança os impactos de suas atitudes e envolva-a na busca por soluções. Por exemplo, se ela jogou brinquedos no chão, ao invés de puni-la, peça para ajudar a organizar e explique a importância de cuidar do que é seu. Isso ensina responsabilidade sem necessidade de imposição.
8. Falta de limites e disciplina
Crianças precisam de regras claras. A ausência de limites pode gerar comportamentos problemáticos, incluindo a sensação de falta de amor na criança. Quando damos limites para nossos filhos, estamos dando atenção e isso gera neles o sentimento de amor. Dizer “sim” para tudo pode dificultar o aprendizado sobre frustração e responsabilidade.
✔ O que fazer no lugar: defina regras claras e explique por que elas são importantes. Seja firme, mas amoroso ao aplicar consequências. Não tenha medo de dizer “não”. Nem tudo precisa ser permitido. Crianças precisam aprender que nem sempre terão o que querem. Ensine a lidar com frustrações de forma saudável
9. Falta de atenção e tempo de qualidade
Estar presente fisicamente, mas distante emocionalmente (por estar sempre no celular, por exemplo), pode impactar o vínculo familiar. Muitos pais possuem rotinas corridas e não conseguem passar tanto tempo com os filhos quanto gostariam. Por isso, é importante que o tempo que passe com os pequenos seja de qualidade.
✔ O que fazer no lugar: reserve tempo para brincar, conversar e se conectar sem distrações (como celular ou TV). Demonstre interesse genuíno pela vida da criança.
10. Excesso de cobranças
Algumas vezes, os pais podem focar nos erros e se esquecer de reforçar os acertos. Crianças que ouvem constantemente críticas excessivas ou sentem que precisam ser perfeitas para serem aceitas tendem a crescer com medo de errar. Isso pode levar à ansiedade, autossabotagem e uma sensação constante de fracasso.
✔ O que fazer no lugar: incentive, mas sem pressionar. Estimule o esforço e não apenas os resultados. Reforce os pontos positivos e ajude a superar dificuldades com paciência.
Fonte: https://revistacrescer.globo.com/maes-e-pais/